Por Alessandra Germano
Você contrataria um funcionário qualquer, pelo período de oito anos, para representar o seu estado com a função de legislar (propor, discutir e deliberar sobre a estrutura legislativa do país), recebendo mensalmente R$ 16,5 mil, mais verba indenizatória de R$ 15 mil?
E se nesse período ele tivesse a brilhante idéia de propor o Dia Nacional do Chester? Isso mesmo, Chester. Aquele frango de proporções enormes que a gente só vê morto e congelado dentro da embalagem plástica.
Pagar essa grana para qualquer funcionário não dá, não é? Além disso, para delegar a outra pessoa o poder de propor leis (que você também terá de cumprir), é necessário conhecer bem suas qualificações e aptidões para tal cargo.
No entanto, não é isso que a gente costuma fazer. A cada quatro anos, recontratamos os mesmos funcionários que desviaram nosso dinheiro, que descumpriram todas suas promessas, que negligenciaram seus próprios empregadores.
É claro que não estou falando de funcionários celetistas que respondem a uma pessoa jurídica qualquer. Estou me referindo aos candidatos eleitos para cargos políticos; que pra mim é ainda mais delicado do que lidar com empregados comuns.
Acredito que isso acontece porque nós não enxergamos o Estado como nossa empresa particular, nem os parlamentares como empregados que trabalham para nós. Mas é justamente isso o que eles são.
Por exemplo, enquanto o senador é eleito para representar um estado, o deputado federal é representante do povo desse estado. E eu não preciso dizer que é esse “povo”, não é? Em outras palavras, é para a gente que eles devem satisfação, afinal, trabalham para nós.
Então, sem saber disso, ou mesmo sabendo, a gente é obrigado a sair de casa num dia de domingo para escolher a pessoa que tomará as decisões por nós, e ainda assim, votamos no mesmo candidato que um dia nos passou a perna… ou na cria dele.
Voltando ao galináceo
O exemplo do Dia Nacional do Chester não foi somente para ilustrar. Esse episódio realmente aconteceu, no dia 3 de abril de 2002, e quem teve a sensacional idéia da proposta foi o então senador Casildo Maldaner (PMDB-SC), eleito para legislatura de 1995 a 2003.
Não há o que se discutir sobre a homenagem à pobre ave morta, congelada e ensacada, que tem importância imensurável à tradição do estado de Santa Catarina, do qual o senador era representante. No entanto, eu me pergunto quem realmente seria o homenageado.
Pois, vale lembrar que Chester®, além de ser uma marca registrada, é produzida EXCLUSIVAMENTE pela Perdigão. Chester® designa toda uma linha de produtos (hambúrguer, salsicha, lingüiça, mortadela, peito defumado, entre outros) desenvolvidos por meio de sucessivas seleções e cruzamentos de linhagens diferentes a partir da espécie Gallus gallus.
Será que a Perdigão, fundada em 1934 por imigrantes italianos em Videira, Santa Catarina, teria patrocinado a candidatura de Casildo Maldaner ao Senado? Isso eu não posso afirmar. Mas sei que, na época, o suplente de Maldaner era Henrique Loyola, empresário do setor têxtil, segundo maior doador de recursos a sua campanha de 1994.
É importante frisar também que suplente de senador não é eleito por voto popular, ele é escolhido pelo próprio candidato. Em outras palavras, quando o senador eleito pelo povo, por algum motivo, se afasta do cargo, quem toma posse é o suplente, escolhido por ele mesmo.
A boa notícia é que o homem do super frango voltou: Casildo Maldaner tomou posse em 1° de julho deste ano como 1° suplente do senador Raimundo Colombo (DEM/SC), licenciado para acompanhar as eleições municipais de Santa Catarina.
É desse jeito, mesmo quando a gente não vota em picaretas, outros se responsabilizam por trazê-los de volta. Casildo Maldaner bem que podia propor o Dia Nacional da Pizza ou da Marmelada, esses sim teriam verdadeiro motivo para existir.
Só para constar:
Ø É papel do senador a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União;
Ø Demandam maior parte do trabalho do senador o que diz respeito às leis orçamentárias, como e quanto o governo gastará o dinheiro público;
Ø Senadores podem compor Comissões Parlamentares de Inquérito (CPI);
Ø É de competência privativa dos senadores processar e julgar o presidente e vice-presidente da República, ministros do Supremo Tribunal Federal, o procurador-geral da República e o advogado-geral da União nos crimes de responsabilidade.